jeudi 5 août 2010

Classificação das Acções


UNIVERSIDADE DE BELAS
LIÇÕES DE DIREITO PROCESSUAL CIVIL

Por Azancoth Ventura





CLASSIFICAÇÃO DAS ACÇÕES



Antes mesmo de classificarmos as acções, pensamos ser pertinente escrever um parágrafo sobre o conceito de acção, porque concluo que muitas vezes a falta de precisão dos conceitos dificulta grandemente a percepção dos temas. Por acção para efeitos do nosso curso, entendemos o direito de soicitar uma prestação jurisdicional, a jurisdição (que é o poder genericamente atribuido, dentro da organização do Estado, ao conjunto de Tribunais, de dirimir conflitos); dito de outra forma, entendemos por acção o direito ao acesso aos Tribunaiis, é a possibilidade conferida pela lei aos sujeitos de procurar a realização da sua pretensão no quadro de actividade de um tribunal.

De acordo com o artigo 4º n.º1 do CPC, utilizando o critério do fim para quê são propostas as acções, são avançadas duas grandes categorias de acções cíveis que são as Declarativas e as Executivas.

As Acções Declarativas destinam-se a obter a declaração pelo órgão judiciário da solução concreta decorrente da ordem juridica para a situação concreta que serve de base à pretanção. Portanto, servem para obter uma sentença, i.e, uma decisão judiciária com força vinculativa.

Ex.: A considera-se proprietátio de um imóvel que lhe foi legado por B e C também considera-se proprietário do mesmo imóvel, uma vez se tratar de herdeiro legitimário.

Se A interntar uma acção contra C, o que pretende é que o Tribunal o declare como legítimo proprietário do referido imóvel.

São Acções Executivas (Art. 4º n.º 3 CPC)aquelas que visam a realização coerciva pelos meios que o Tribunal dispõe da efectiva declaração do direito violado. Portanto, fazem com que o tribunal realize o direito violado pela força da sentença que proferiu, ou por algum outro título com força executiva (título executivo[1] Art. 46º CPC).

Se tivermos uma sentença declarativa de condenação (ou outro título executivo) e o réu não queira voluntariamente cumprir, a sentença de nada valerá, pois o nosso sistema é um sistema de justiça pública, onde o estado detém o privilégio de tutela dos direitos.

As acções executivas podem ser para:
Pagamento de quantia certa (811º ss CPC)
Entrega de coisa certa (928ºss CPC)
Prestação de facto (933ºss CPC)


De acordo com o n.º 2 do art. 4º CPC, as Acções Declarativas por seu turno dividem-se em:

Acções Declarativas de Símples Apreciação;
Acções Declarativas de Condenação; e
Acções Declaraticas Constitutivas.



Critérios de Distinção das Acções


Todas as Acções envolvem o reconhecimento da existência ou inexistência de um direito. Porém a chave de distinção reside no facto da pretenção do autor para além do reconhecimento da existência/inexistência deste direito:

1. Se além do reconhecimento da existência/inexistência do direito o autor ter o interesse ou pretender que o Tribunal condene o réu a realização de uma prestação destinada a reintegrar o direito violado então estamos perante uma Acção de Condenação;

2. Se para além do reconhecimento da existência/inexistência do direito o autor ter o interesse ou pretender tão somente, a produção dos efeitos jurídicos correspondentes decorrentes da lei, estaremos perante uma Acção Constitutiva;

3. Se além do reconhecimento da existência/inexistência do direito o autor nada mais pretender estamos perante uma Acção de Símples Apreciação.

ACÇÕES DECLARATIVAS DE CONDENAÇÃO: Nestas acções o autor arroga-se na titularidade de um direito que afirma estar a ser violado (ou prevendo a violação) pelo réu. Portanto, o autor pretende duas coisas: 1- Que se declare a existência e a violação do direito; e 2 – Que se diga ao réu que tem de realizar a prestação destinada a reintegrar o direito violado.

Ex.: O credor que imputa ao réu a falta de cumprimento da obrigação.

Uma Acção proposta pelo dono da coisa abusivamente ocupada por um trceiro. O autor pretende primeiro o reconhecimento do direito de propriedade e segundo, que o tribunal ordene ao réu a entrega da coisa e indemnize o autor pelo facto de ficar ilicitamente privado da coisa.

NOTA: apenas as sentenças de condenação constituem títulos executivos.

ACÇÃO DECLARATIVA CONSTITUTIVA: Nestas acções o que o autor pretende é obter um efeito jurídico novo que altere a esfera jurídica do réu, independentemente da vontade deste. Trata-se do efeito jurídico que uma vez requerido e comprovada a existência dos pressupostos da mesma, basta a intervenção do Tribunal para que se verifique imediatamente.
São chamadas Acções constitutivas porque da decisão judicial nasce ou constitui-se um novo efeito jurídico. O efeito jurídico pretendido pelo autor poderá ser um dos seguintes:

Criação de uma relação jurídica entre o autor e o réu (constitutivo strictu senso). Ex: Acção de reconhecimento de paternidade;
Modificação de uma relação jurídica entre o autor e o réu ( constitutivo modificativo). Ex.: Acção de Separação judicial de pessoas e bens; ou
Extinção de uma relação jurídica entre o autor e o réu (constitutivo extintivo). Ex.: Acção de Divórcio

Em nenhuma das acções supracitadas, o autor pretende que o réu seja condenado a realizar uma prestação. Aponta-se apenas para o efeito decorrente daacção que produz de imediato uma mudança no mundo jurídico.

ACÇÃO DE SÍMPLES APRECIAÇÃO (POSITIVA ou NEGATIVA): São aquelas em que o autor reagindo contra uma situação de incerteza, pretende obter uma declaração da existência (simples apreciação positiva) ou inexistência (símpples apreciação negativa) de um direito ou de um facto por meio de uma decisão judicial vinculativa.

Ex.: 1. O autor de um livro que assinou com um pseudónimo que contesta a outoria do livro por meio de uma acção de símples apreciação positiva.

Ex.: 2. A é dono de um prédio e quer vendê-lo. Tem um vizinho intreiguista B que não quer que ele venda o prédio e faz correr no bairro que é titular de uma servidão de passagem (que desvaloriza o prédio) sobre o prédio em questão. A tem de intentar uma acção de símples apreciação negativa para que o Tribunal declare a inexistência da referida servidão.

NOTA: os factos de cuja a existência ou inexistência se procura demonstrar têm de ser factos com relevância jurídica sob pena de mau uso do processo.

Bibliografia

Antunes Varela e outros, Manual de Processo Civil, 2ª Edição, Coimbra Editora, 1986
António Montalvão Machado e Paulo Pimenta, O Novo Processo Civil, 10ª Edição, Almedina, 2008
Instituto Nacional de Estudos Judiciários, Manual do Magistrado Municipal, Edijuris, 1ª Edição, 2006


[1] É um documento que, pela sua força probatória, abre directamente as portas da acção executiva, por conter prova da existência, titularidade e objecto da obrigação; in Manual do Magistrado Municipal, Instituto Nacional de Estudos Judiciários, Edijuris, 2006, p. 56.

mardi 20 avril 2010

Casos Práticos Princípios Processuais

Universidade de Belas (Unibelas)


Casos Práticos sobre os Princípios Processuais


1. Kaweto provou em tribunal que a quinta X pertencia ao seu falecido pai, José Zangue, que lhe pertenceria por vias sucessórias. Mungalo instaurou uma acção de investigação de paternidade provando que José Zangue era também seu pai. Kaweto decide requerer que o tribunal rejeite as provas de que a quinta X pertencia a José Zangue para que Mungalo não beneficiasse também da mesma através da sucessão. Quid Juris?

2. Ilda formulou contra Helina um pedido de condenação no pagamento de uma indemnização no valor de 350000 Kzs. Heliana, na contestação, confessou o pedido. Quid Juris?

3. Kabila intenta uma acção contra Navimbwando, irmão gémeo de Sónia, que Kabila desconhecia. Navimbwando contesta dizendo que é parte ilegítima. Quid Juris?

4. Gedeão propôs contra Catito uma acção de investigação de paternidade. Catito não contesta, em consequência, o juiz dá como provados os factos constantes na Petição Inicial, terá o juiz procedido bem?

5. Ao Julgar o caso entre Ilinga e Keza, o juz chega a conclusão que, na sua opinião, a solução preconizada pela lei não é a ideal, na medida em que pela lei Ilinga sairia ileso do processo sendo que o juiz sabia que ele era culpado. Assim sendo, o juiz decide basear a sentença nas alegações da Keza e não na lei. Quid Juris?


6. Eduardo propõe contra Filipe uma acção de reivindicação e arrola duas testemunhas. O tribunal prescinde da sua inquirição em audiência, limitando-se a ler os seus depoimentos, que haviam sido reduzidos a escrito e juntos ao processo antes da audiência. Haverá alguma irregularidade? Quais as consequências?

7. Gustavo propõe contra Hélia uma acção de anulação de um contrato de compra e venda e junta ao processo um documento como meio de prova. Hélia não é notificada da junção do documento e, todavia, o tribunal toma-o em consideração para efeitos de decisão. Quid Juris?

8. Ilda propõe contra João uma acção de declaração de nulidade de um contrato. O tribunal decide adquerir a testemunha X, que não havia sido arrolada pelas partes. Quid juris?


9. Gioconda intenta uma acção contra Orlando afirmando que este lhe devia Kzs 10.000.000.00 apresenta como prova um contrato que falsificou no Imbondeiro. Com receio de ser descoberta, Gioconda requer ao juiz que não permita que ninguém assista ao julgamento com o fundamento de não manchar a imagem de Orlando. Quid Juris?

lundi 19 avril 2010

Interpretação, Integração e Aplicação da Lei Processual no Tempo

UNIVERSIDADE DE BELAS
LIÇÕES DE DIREITO PROCESSUAL CIVIL

Por Azancoth Ventura






I. INTRODUÇÃO


1.4 Interpretação da Lei Processual

Existe o velho aforismo jurídico segundo o qual ‘in claris non fit interpretatio’, para as situações óbvias não é necessário interpretações, não complicar o óbvio. A necessidade de interpretação nasce da possibilidade de determinada norma poder ter mais do que um sentido. Tal como qualquer outra norma, as normas do Direito Processual podem ter vários sentidos. Assim sendo, é importante estabelecer aquele que deverá prevalecer. Para que exista certeza em Direito é necessário estabelecer critérios uniformes de interpretação das normas jurídicas.

Portanto, interpretação é o procedimento lógico através do qual se obtém o significado, o conteúdo e o alcance das normas jurídicas.

O Processo Civil não contém uma alguma disposição que contenha critérios para interpretar suas normas, não há artigo nenhum que de modo exclusivo especifica o modo de interpretação das normas processuais.

Assim sendo, para interpretarmos as normas processuais, devemos fazer recurso as regras estabelecidas no direito civil, comum e subsidiário constantes do artigo 9º CC.[1]

Segundo o artigo 9º CC, a ainterpretação contém dois elementos fundamentais: a letra (quod script est) e o espírito (ratio legis), não descorando os outros elementos como são o pensamento do legislador (mens legislatoris), as circunstâncias do momento em que foram elaboradas e do tempo em que são aplicadas, etc.

Com base nos elementos de interpretação podemos ter 3 tipos de interpretação[2]:

DECLARATIVA: que verifica-se quando o sentido da lei cabe dentro da sua letra. O legislador disse o que exactamente queria dizer. Há uma conformidade entre o que se disse e o que se queria dizer. Dixit tantum quanto voluit.

EXTENSIVA: nesta situação o interprete percebe não existir uma coincidência entre o que o legislador disse e o que realmente queria dizer. O legislador não conseguiu exprimir totalmente o que queria dizer. O sentido ultrapassa a letra da lei. O espírito da lei vai mais longe do que aquilo que está escrito. Minus dixit quan voluit.

REESTRITIVA: nesta situação o interprete percebe que há uma não correspondência entre o que o legislador disse e o que realmente queria dizer. O legislador disse mais do que realmente queria dizer. Usou uma fórmula bastante ampla para descrever o que realmente pretendia. A çetra da lei ultrapassao sentido desta. Maius dixit quan voluit.

Apesar de fazermos recurso ao direito civil comum e subsidiário, para interpretar as normas do direito do processo, existe todavia uma especificidade da lei processual que é fundamental termos em consideração. Trata-se do facto do processo civil estar impregnado por um conjunto de princípios gerais previstos em muitas das suas normas. Ex.: Princípio do Contraditório (auditur altera pars); o Princípio do Dispositivo (as partes é que conduzem o processo, o juíz é puro árbitro), o Princípio da Igualdade das armas ou das partes (isonomia). E a aplicação destes princípios é fundamental na aplicação da lei processual.

A lei processual deve portanto ser interpretada de forma a não ferir os princípios gerais do processo.

Ex.: O artigo 477º /1 CPC. Quando a PI for irregular, o juiz deverá convidar o autor a corrigi-la. Não existe disposição semelhante em relação a contestação, no entanto para que o princípio da igualdade das partes não seja preterido, a mesma oportunidade será concedida ao réu caso a contestação tenha alguma irregularidade passível de ser corrigida.

1.5 Integração da lacunas na Lei Processual

Tal como em qualquer outro ramo de direito, também no direito processual civil existem lacunas, existem aspectos que o legislador não previu. Em atenção ao artigo 8º CC, em que está consagrada a proibição do ‘non liquet’, isto é, onde está consagrado o poder/dever do tribunal de compor a causa mesmo em caso de lacunas de previsão do legislador. Dito de outro modo, o tribunal não poderá invocando uma lacuna deixar de resolver um litígio. O tribunal está sempre obrigado a julgar.

Caso se verifique uma lacuna nas normas processuais ter-se-á de se recorrer aos critérios estabelecidos pelo Código Civil artigo 10º. Recurso à analogia e caso não for possível, o legislador deve criar uma norma que se adeqúe/enquadre dentro tendo em atenção o espírito e a unidade do sistema jurídico.

As normas processuais deverão ser integradas à luz dos princípios do processo civil.


1.6 Aplicação das Normas Processuais no Tempo

Em relação a este tema, faremos recurso ao artigo 12º CC, segundo o qual “a lei só dispõe para o futuro”, i.e. a lei nova não tem eficácia retroactiva, seus efeitos são ‘ex nunc”.

Como o Processo é uma sequência de actos, significa que os actos processuais já praticados antes da entrada em vigor da nova lei serão respeitados.

Coloca-se a seguinte questão: o que acontecerá se entra em vigor uma nova lei depois da acção já ter sido instaurada, mas a causa ainda não ter sido definitivamente decidida?

Haveria duas soluções possíveis:

1- a nova lei aplicar-se apenas às acções que forem propostas depois da sua entrada em vigor;

2- An nova lei aplicar-se àsa acções que se encontrem pensentes, aos actos que forem nela praticados depois da entrada em vigor da nova lei.

No nosso ordenamento jurídico vigora em relação ao Processo Civil, a posição que consta da segunda solução, i.e., a Lei Processual tem aplicação imediata, portantoa a nova lei será aplicada não só às acções que sejam instauradas posteriormente a sua entrada em vigor, mas também aos actos que ainda tiverem de ser praticados nas acções já pendentes (art.º 142º CPC) – Princípio da Aplicabilidade Imediata da Lei Processual[3].

A forma dos diversos actos processuais é regulada pela lei que vigore no momento em que são praticados” (art.º 142º CPC).


Bibliografia

Antunes Varela e outros, Manual de Processo Civil, 2ª Edição, Coimbra Editora, 1986
António Montalvão Machado e Paulo Pimenta, O Novo Processo Civil, 10ª Edição, Almedina, 2008
Mariana França Gouveia, A Causa de Pedir na Acção Declarativa, Almedina, 2004
Mariana França Gouveia, Regime Processual Experimental Anotado, Almedina, 2006
António Montalvão Machado e Paulo Pimenta, O Novo Processo Civil, 10ª Edição, Almedina, 2008Miguel Teixeira de Sousa,
Notas:
[1] Alguns autores discordam da existência de um artigo como o 9º do CC apontando as seguintes críticas:
· As normas sobre a interpretação não se tratam de preceitos jurídicos, mas meramente técnicos;
· Os critérios de interpretação são o que são, independentemente de o legislador os consagrar ou não num determinado ordenamento jurídico;
· Os critérios de interpretação são prévios à norma que os define como deve ser a interpretação (mesmo as normas que definem como deve ser a interpretação também precisariam de ser interpretadas).

Não obstante estas críticas, esta teoria passou a ser minoritária e hoje até se pode falar de unanimidade em relação a necessidade e importância de um artigo, como é o 9º do CC, pois a interpretação não impõe soluções, mas apenas caminhos possíveis, pois assim caberá a lei determinar qual o caminho que deverá seguir cada ordenamento jurídico.

[2] Há ainda outros tipos de interpretação por vós ja estudadas nas cadeiras de Introdução ao Estudo do Direito e teoria Geral do Direito Civl:
· A interpretação gramatical que utiliza as regras da linguística, é a análise filológica do texto (a primeira interpretação que se faz).
· A interpretação lógica serve-se da reconstrução da mens legislatoris para saber a razão da lei (ratio legis).
· A interpretação sistemática verifica a harmonização do texto com o sistema jurídico no qual acha-se inserido. Tem em consideração a Unidade do Sistema Jurídico. Não podendo haver contradições ‘inter se’.
· A interpretação histórica verifica a relação da lei com o momento da sua criação (occasio legis).
· A interpretação histórico-evolutiva verifica a relação da lei com o momento da sua aplicação. As especificidades do tempo em que são aplicadas.
· A interpretação sociológica verifica a finalidade social a que a lei deve satisfazer.

[3] Em direito processual quer seja civil quer penal vigora o principio do Tempus regit actum que è uma locução latina traduzida em italiano "il tempo regge l'atto" e em português por “o tempo rege o acto” por base no qual aplica-se a lei do processo em vigor ao momento da causa. As regras de direito de aplicação da lei no tempo, consagram o princípio tempus regit actum, de modo que a lei processual nova tem eficácia imediata, incidindo sobre os actos praticados a partir do momento em que se torna obrigatória, não produzindo efeitos, todavia, aos actos consumados sob o império da legislação anterior, sob pena de retroagir para prejudicar o direito adquirido, o acto jurídico perfeito e a coisa julgada.

mercredi 14 avril 2010

Características e Importância Prática do Processo Civil

UNIVERSIDADE DE BELAS
LIÇÕES DE DIREITO PROCESSUAL CIVIL

Por Azancoth Ventura



I. INTRODUÇÃO

1.2 Características do Direito Processual Civil


1ª CARACTERÍSTICA

Ramo do Direito Instrumental ou Adjectivo

Diferentemente dos ramos de direito civil material ou substantivo, o Direito Processual Civil é um ramo do direito adjectivo, suas normas não facultam a solução aplicável ao conflito de interesses solicitado, nem dá resposta para a questão da existência ou não de determinado direito invocado pelo autor, requerente ou demandante. Ex.: imaginemos que o autor reivindica a propriedade de uma coisa que o réu possua e por seu lado o réu reivindica para a si a propriedade da mesma coisa, estamos perante um litígio e não serão as normas do D. Processual Civil que irão determinar quem tem o direito de fundo, a propriedade da coisa em questão. Os critérios normativos que indicam a quem pertence a coisa X, são indicados pelo Direito Civil (material ou substantivo) e não pelo Direito Processual Civil.

São os critérios fixados pela generalidade e abstração do Direito Civil que indicarão a quem pertence a titularidade de determinada coisa X. Caberá apenas ao Direito Processual Civil regular os meios necessários para que o Direito Civil possa ser aplicado na resolução de conflitos concretos.

O Direito Processual não se refere aos conflitos substanciais de interesses entre os particulares, quem o faz é o Direito Civil por ser substantivo ou material.

Podemos entar concluir que o Processo Civil é um instrumento necessário para a aplicação do Direito Civil geral e abstracto ao caso concreto.

2ª CARACTERÍSTICA

Ramo do Direito Público

O Direito Processual é um ramo do direito público por duas razões: pelo critério da posição dos sujeitos, um dos sujeitos desempenha funções de soberania ‘ius imperii’ e uma segunda razão é a natureza dos direitos tutelados pelo Direito Processual Civil.

Considera-se Direito Público, desde o critério da posição dos sujeitos, o conjunto de normas que regulam as relações em que um dos sujeitos exerça uma função de soberania, e que por conseguinte se estabelece entre os sujeitos, uma relação de subordinação.

É inegável que no processo civil haja um sujeito com função de soberania (juiz) e também é inegável a existência de uma subordinação das partes ao juiz. Como prova disto é a força vinculativa que têm as decisões jurisdicionais.

Em conclusão o juiz exerce uma função de soberania que é a função jurisdicional, sendo ipso facto, o Direito Processual Civil um ramo do Direito Público.

Quanto aos interesses tutelados pelo Processo Civil, podemos dizer que são fundamentalmente interesses públicos, não obstante na acção se encontrarem em jogo interesses particulares ou privados, como o são os interesses das partes (autor e réu), o processo persegue interesses públicos, existe para que não tenhamos um sistema de justiça privada, sistema este que levaria a excessos, perigando a justiça, a órdem e a paz social multiplicando o conflito entre os particulares.

O sistema de justiça pública tem como fim primordial garantir através da resolução de conflitos privados a manutenção da órdem e da paz social.

Assim, como o principal interesse do processo é a manutenção da órdem e da paz social que é um interesse público, logo o Direito Processual é um ramo do Direito Público.


1.3 Importância Prática do Processo Civil

Não obstante ser o Direito Processual Civil um ramo do Direito instrumental, a sua influencia na decisão do juiz é total, de tal forma que a má condução do processo, seja por desconhecimento das regras processuais, seja por má aplicação das mesmas, poderá fazer com que a parte perca a causa, apesar do direito subjectivo lhe ser favorável.

Ex.: uma pessoa pode ser titular de um direito a ser disputado num litígio, mas o não saber jogar as regras do processo pode acabar por perder a causa se o seu advogado prestar um mau serviço (art.º 486º1 e 484º 1).

O autor dá início ao processo através de uma acção, nesta acção deduz um pedido contra o réu. O réu é citado, i.e., o tribunal dá ciência ao réu de que foi intentada uma acção contra si. Se o réu não contestar, i.e., não defender-se (dar cumprimento ao princípio do contraditório), os factos deduzidos pelo autor consideram-se confessados.

- Art.º 685º 1 e 677º CPC (Prazos de interposição do recurso)
- Art.º 661º1 – vício de excesso de pronúncia


Bibliografia

Antunes Varela e outros, Manual de Processo Civil, 2ª Edição, Coimbra Editora, 1986
António Montalvão Machado e Paulo Pimenta, O Novo Processo Civil, 10ª Edição, Almedina, 2008

jeudi 8 avril 2010

I. Introdução: Noção de Direito Processual Civil

UNIVERSIDADE DE BELAS

LIÇÕES DE DIREITO PROCESSUAL CIVIL

Por Azancoth Ventura


I. INTRODUÇÃO

1.1 Noção de Direito Processual Civil

De um modo geral podemos afirmar que o direito processual civil constitui a aplicação prática do direito civil no quotidiano forense. É o ramo do Direito Público funcionalmente destinado a integrar o direito civil.

Sendo o direito civil/Privado[1] o conjunto de normas reguladoras das relações jurídicas estabelecidas entre particulares entre si ou entre os particulares e os entes públicos, desde que estes estejam despidos do ‘ius imperii’ ou poder de soberania.

No direito civil (obrigações, reais, família, comercial...) existe sempre uma correspondência entre um direito e um dever, ou seja, se uma das partes da relação jurídica possui um direito, necessáriamente a outra terá um dever correlativo. A todo o direito corresponde um dever correlativo. Se A é credor de Akz 1.000.000.00, B será devedor de Akz 1.000.000.00.

No caso de inadiplimento, isto é, se B não cumprir a sua obrigação, o direito civil (material ou substantivo) isoladamente não conseguirá solucionar a situação concreta. Surgindo assim uma questão: como aplicar as normas do Direito civil aos casos concretos?

Haveria duas hipóteses de o fazer, ou através de um sistema de justiça privada (sistema de autotutela), ou então através de um sistema de justiça pública (sistema de heterotutela).

Num sistema de justiça privada (sistema de autotutela), a aplicação da justiça, ou melhor a tutela dos direitos concedidos pela ordem jurídica ficaria a cargo dos particuláres. Em última análise, neste sistema haveria a faculdade do sujeito lesado, pela sua própria força e meios, impor ao caso concreto a solução preconizada pelas normas de direito civil.

Este sistema foi muito utilizado nas comunidades primitivas, mas inadequado para as comunidades hodiernas, pois muitas vezes a força e o poder não se encontram necessáriamente do lado daqueles que possuem os direitos violados ou que actuaram de acordo com a lei, portanto a aplicação da justiça por mãos próprias mais facilmente conduziria à violação dos direitos do que a concretização da justiça.

Por outro lado, sendo que o lesado não é uma parte isenta na lide, a aplicação do justiça por si, levaria a excessos, isto é, violaria um dos princípios basilares de justiça que é o princípio da proporcionalidade[2]. Referimo-nos a proporcionalidade entre a sanção e a infracção ou lesão causada.

Este sistema de justiça privada, por poder violar um igrediente basilar da justiça que é a proporcionalidade, possibilitaria a aplicação de penas injustas, fazendo com que o sistema falhasse com um dos fins últimos do direito que é o asseguramento da paz social e a reposição da órdem jurídica, conduzindo assim a uma multiplicação e agravamento dos conflitos entre os particuláres.

Devido a esta dupla razão, o nosso ordenamento jurídico não admite o sistema de justiça privada (art.º 1º CPC), permitindo excepções bastante apertadas, na ressalva que o mesmo artigo faz ‘in fine’: ‘salvo nos casos e dentro dos limites declarados na lei’, referindo-se às situações em que o recurso às outoridades públicas não seja viável (art.º 336º, 337º e 339º CC).

No sistema de Justiça pública (sistema da heterotutela), não significa que no caso de conflito entre os particulares sejam os tribunais a promover “ex officio” à acção. Não é o tribunal que por sua própria iniciativa, sem que a parte lesada nada faça dá início ao processo (princípio do dispositivo).

No direito civil é ao particular que recai o ônus[3] de promover e impulsionar a acção. Se o particular não der início à acção, não o fará o tribunal por iniciativa própria. O tribunal tem o jus dicere ou jus dare i.e. o poder não de fazer a lei, mas sim expô-la ao caso concreto.

Ao sujeito que requer do tribunal a providência (que intenta a acção) dá-se o nome de autor, demandante ou requerente e a pessoa contra quem a providência é requerida dá-se o nome de réu, demandado ou requerido.

De acordo com o artigo 3º, para que o conflito seja resolvido não basta que o tribunal tome conhecimento das razões do queixoso. O tribunal derevá conceder à contraparte o direito de se defender deduzindo oposição (princípio do contraditório).

Ao lesado cabe o direito da acção e ao demandado o direito de defesa. O autor propõe a acção e o réu defende-se, seguido de um subsequente conjunto de actos até que o juíz chegue a uma conclusão. A forma como os actos subsequentes se desenvolvem não é arbitrária, mas sim seguem regras e ao conjunto destas regras constituem o Direito Processial Civil.

Assim sendo, “Processo Civil é o conjunto de normas reguladoras dos tipos, formas e requisitos da acção civil, bem como as formalidades que devem ser observadas em juizo na propositura da acção.” Prof. Antunes Varela.
________________


[1] Fruto da ‘summa divisio’ que faz trespassar uma linha divisória estabelecendo de um lado, um direito público e do outro um direito privado. Chama-se direito Privado o conjunto de normas que regem a relação entre indivíduos (pessoas singulares ou colectivas) e o Estado.
Desde este ponto de vista caem na alçada do Direito Público o Direito Constitucional, o Direito Administrativo, o Direito Penal.

Muito genericamente falando, endende-se por Direito Privado como o ramo do direito que regulam os fenómenos jurídicos que afectam as relações entre indivíduos entre si ou grupos sem a intervenção do estado.

Há uma grande discussão na distinção entre direito público e privado, as teorias mais sonantes são as que se seguem:

Teoria do Interesse (Interest theory): De acordo a esta teoria, defendida pelo jurista romano Ulpiano, o direito público rege as questões de interesse público. Esta teoria pode ser criticada pelo facto das questões de direito privado poderem afectar o interesse público.

Teoria da Sujeição (Subjection theory): que enfatiza a distinção entre Direito Público e Direito Privado na subordinação das pessoas privadas ao estado (é suposto que as normas do direito público os sujeitos estariam numa situação de supra-infra ordenação ao passo que nas normas de direito privado os sujeitos estariam numa situação de paridade. Porém esta teoria peca no facto de areas comumente consideradas do direito privado haja ainda uma situação de subordinação, v.g. Direito do trabalho onde há uma situação de subordinação do empregado em relação ao empregador.

Teoria dos Sujeitos (Subject theory): considera direito público o que regula as atribuições , direitos e deveres das autoridades públicas. Esta teoria cai em terra, pois o estado, os entes públicos podem contratar-se (contrair direitos ou obrigações) no âmbito do direito privado.

Combinação entre a Teoria da Sujeição e a Teoria dos Sujeitos (Teoria Híbrida ou Ecléctica): esta teoria traz uma posição mais defensável. Desde este ponto de vista, considera-se do direito público quando:
- Um dos actores é uma autoridade pública dotada do poder de autoridade (jus imperium), e
- Esta actor usa do referido imperium na referida relação particular.

De acordo com a última teoria há áreas do Direito em que há uma autêntica mistura, i.e. partes regidas pelo direito público (ex.: actividades de inspecção das actividades laborais, segurança no trabalho, etc) e partes regidas pelo direito privado (ex.: contrato de trabalho).

Esta diferenciação é principalmente um debate académico, porém tem implicações de órdem prática uma vez que permitem determinar o tribunal competente para dirimir determinado litígio.

[2] Princípio da proporcionalidade, um principio transversal em diferentes ramos do direito, egundo o qual não se deve tomar qualquer acção que exceda o que é necessário para alcançar determinado objectivo.

[3] Do latim ónus,eris (carga, peso, encargo, fardo), trata-se do dever, encargo ou obrigação que um determinado sujeito tem de adoptar certa conduta para fazer valer seu direito ou afastar qualquer encargo ou efeito danoso na sua esfera jurídica.
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Bibliografia

Antunes Varela e outros, Manual de Processo Civil, 2ª Edição, Coimbra Editora, 1986
António Montalvão Machado e Paulo Pimenta, O Novo Processo Civil, 10ª Edição, Almedina, 2008

mercredi 7 avril 2010

Apresentação da Cadeira de Processo Civil Declarativo

UNIVERSIDADE DE BELAS

Professor:

Azancoth Ventura (Licenciado)



APRESENTAÇÃO DA CADEIRA DE PROCESSO CIVIL ANO 2010



1. Curso:

Direito

2. Cadeira

DIREITO PROCESSUAL CIVIL DECLARATIVO
Ano Lectivo 2010

3. Ano curricular



4. Coordenador da Área Científica

???

5. Professor

Azancoth Ventura


6. Professores Assistentes

???

7. Língua de ensino

Portuguesa


8. Objectivos Gerais


Dotar os alunos dos conhecimentos necessários ao domínio da legislação que disciplina os requisitos das acções declarativas, bem como os actos susceptíveis de serem praticados em juízo, desde a apresentação da petição inicial até à prolação da decisão final.

Alcançar uma primeira aproximação dos alunos às práticas processuais civis declarativas.


9. Objectivos Específicos

Aprendizagem:

- Da disciplina do processo comum declarativo.
- De aspectos da praxis forense.
Aptidão para o exercício de profissões forenses


10. Competências a adquirir

Pedagogia activa quer nas aulas teóricas quer, naturalmente, nas aulas teórico-práticas.
Recurso à simulação de situações processuais com intervenção dos alunos. Incentivo à
investigação. Organização de debates.


11. Proposta de Programa do Curso

I. Introdução
1.1 Noção de Direito processual Civil
1.2 Características do Direito Processual Civil
1.3 Interpretação e Integração da Lei Processual
1.4 Integração das Lacunas na Lei Processual
1.5 Aplicação da Lei Processual no Tempo
1.6 Princípios Fundamentais do Direito Processual Civil
II. Classificação das Acções
2.1 Quanto ao Objecto
2.2 Quanto à Forma
2.3 Quanto ao Interesse em Discussão
III. Pressupostos Processuais
3.1 Considerações Gerais
3.2 Pressupostos Relativos às Partes
3.2.1 Personalidade Judiciária
3.2.2 Capacidade Judiciária
3.2.3 Legetimidade
3.2.3.1 Legimitidade Singular
3.2.3.2 Pluralidade das Partes: Litisconsórcio e Coligação
3.2.4 Patrocínio Judiciário Obrigatório
3.2.5 Interesse em Agir
3.3 Pressupostos Relativos ao Tribunal
3.3.1 Preliminares
3.3.2 Competência Internacional
3.3.3 Competência Interna
3.3.3.1 Em razão da Matéria
3.3.3.2 Em Razão da Hierarquia
3.3.3.3 Em razão do Valor da Causa e da Forma do Processo
3.3.3.4 Em razão do Território
3.4 Pressupostos Relativos ao Objecto da Causa
3.4.1 Aptidão da Petição Inicial
3.4.2 Não verificação da Litispendência e do Caso Julgado
3.5 Falta de Pressupostos Processuais
3.5.1 Relativos às Partes e seu Eventual Suprimento
3.5.2 Relativos ao Tribunal
3.5.3 Relativos ao Objecto da Causa e seu eventual Suprimento
3.6 Ineficácia da falta não sanada dos Pressupostos Processuais
IV. Formalismos processuais
4.1 As Fases do Processo Declarativo Ordinário
4.1.1 Articulados
4.1.1.1 Petição Inicial
4.1.1.2 Distribuição e Autuação do Processo
4.1.1.3 Citação do Réu
4.1.1.4 Contestação
4.1.1.5 Revelia do Réu
4.1.1.6 Réplica
4.1.1.7 Tréplica
4.1.1.8 Articulados Supervenientes
4.2.2 Saneamento
4.2.2.1 Despacho Pré Saneador
4.2.2.2 Audiência Preliminar
4.2.3 Instrução
4.2.4 Discussão e Julgamento
4.2.5 Sentença
4.2 Formalismos do Processo Declarativo Sumário~
4.2.1 Articulados
4.2.2 Saneamento
4.2.3 Instrução
4.2.4 Discussão e Julgamento
4.2.5 Sentença
4.3 Formalismos do Processo Declarativo Sumaríssimo
4.3.1 Articulados
4.3.2 Audiência Final

12. Critério de Avaliação
Serão considerados especialmente relevantes os seguintes aspectos:
- Assiduidade
- Elaboração de trabalhos escritos sobre os temas a propor no início do ano.
- Participação nos debates a realizar
- Provas de Frequência e Exame Final
Outros de acordo com as regras de avaliação emanadas pela Universidade de Belas.

13. Métodos de Avaliação
- Contínuo

14. Recursos Didácticos
Exposição das lições em palestras
Power-point



15. Sugestão Bibliográfica

J.O. Cardona Ferreira, Textos de Apoio de Dt.º Processual Civil Declarativo, Lusíada, Lisboa, 2008
Antunes Varela e outros, Manual de Processo Civil, 2ª Edição, Coimbra Editora, 1986
Alberto dos Reis, Código Processo Civil - Anotado Vol. II - III – IV, 1984
José Lebre de Freitas, Introdução ao Processo Civil, Coimbra Editora, 1996
José Lebre de Freitas, João Redinha e Rui Pinto, Código de Processo Civil Anotado – Volume 1.º, 2ª Edição, Coimbra Editora, 2008
José Lebre de Freitas, A Acção Declarativa Comum, Coimbra Editora, 2000
José Lebre de Freitas, A. Montalvão Machado, Rui Pinto, Código de Processo Civil Anotado – Volume 2.º, 2ª Edição, Coimbra Editora, 2008
António Santos Abrantes Geraldes, Temas da Reforma do Processo Civil – I Volume, 2ª Edição, Almedina, 2003
António Santos Abrantes Geraldes, Temas da Reforma do Processo Civil – II Volume, 4ª Edição, Almedina, 2004
Mariana França Gouveia, A Causa de Pedir na Acção Declarativa, Almedina, 2004
Mariana França Gouveia, Regime Processual Experimental Anotado, Almedina, 2006
António Montalvão Machado e Paulo Pimenta, O Novo Processo Civil, 10ª Edição, Almedina, 2008
Miguel Teixeira de Sousa, Estudos sobre o Novo Processo Civil, Lex, 1997

III Legislação

Código de Processo Civil
Código Civil
Portaria 23 090
Lei n.º 10/86
Lei n.º 20/88
Lei n.º 16/03
Outra legislação avulsa ...

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Ad unquem é uma iniciativa de prover matéria doutrinal, primeiramente de Direito Processual Civil Angolano, depois quiçá de alguma outra matéria àqueles que tiverem sede. Quem tiver sede que venha ter ao afluente do grande rio que é o saber.

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